Religião
sempre foi tema espinhoso. Tanto que circula por aí uma máxima popular que
lista três temas-tabu acerca dos quais é bom evitar discussão: política,
futebol e – como é previsível – religião. Paradoxalmente, eventuais polêmicas
em torno dos dois primeiros temas são compreensíveis: no futebol, centenas de
equipes disputam a simpatia dos torcedores, pulverizando preferências e, por
esta razão, despertando apaixonadas e inconclusivas discussões. A política, por
sua vez, segue uma regra tautológica: se há governo, logo, há oposição. Mesmo
minúscula ou lipoaspirada pelos encantos dos cofres públicos. Sendo assim, há
debate e divergência.
Na seara da
religião, no entanto, diversidade é coisa recente no Brasil. É que, ao longo de
séculos, a Igreja Católica exerceu monopólio quase exclusivo sobre corações e
mentes daqueles que pleiteavam conexão com o divino. Logo, divergência era
coisa isolada. Isso até aproximadamente meados do século XX, quando os brados
exaltados dos pastores começaram a se sobrepor às pregações mansas dos padres
católicos.
Em
Feira de Santana, por exemplo, o rebanho católico encolhe, apesar do
crescimento da população. Em 1991 os católicos representavam 334 mil pessoas.
Dez anos depois, eram 327 mil, para recuar para 318 mil em 2010. Ao longo dos
mesmos 19 anos, a população feirense passou de 406 mil para 556 mil. Todos os
números são de censos do IBGE.
No sentido
oposto, os chamados evangélicos expandiram-se de maneira robusta: eram, no
total, 27 mil em 1991; saltaram para pouco mais de 80 mil no censo seguinte,
alcançando, por fim, 108 mil fieis no último levantamento, em 2010.
Representam, portanto, cerca de um sexto da população. O total agrega os
chamados pentecostais e as demais vertentes, que se pulverizam em dezenas –
talvez centenas – de denominações diferentes.
Proliferação
Uma série de
indícios sinalizava o crescimento dos evangélicos na Feira de Santana. O mais
evidente é o surgimento de novos templos: em garagens, antigas borracharias,
mercados de bairro falidos e até em instalações de bares e restaurantes, com
frequência impressionante, surgem templos improvisados, sobretudo nos bairros
periféricos. Alguns prosperam e, com reformas, ganham ar mais condizente com a
sisudez religiosa; a maioria, porém, pouco frequentada, fecha em pouco tempo.
Outro indício
foi o crescimento da chamada bancada evangélica, pejorativamente batizada de
“bancada do dízimo”. Estão presentes em todos os parlamentos, com os mesmos
discursos conservadores, a mesma disposição messiânica e – aqui ou ali –
escorregam em escândalos de corrupção, já que a carne é fraca. Foi o caso, por
exemplo, da Máfia dos Sanguessugas, que envolveu boa parte da bancada federal em
2006.
O esforço
agressivo para promover conversões em massa, a propaganda baseada na
banalização dos milagres e – sobretudo – o uso maciço da programação televisiva
explicam parte do êxito. Porém, nem tudo na discussão religiosa é conversão. Há
outras tendências em curso.
Sem religião
No Censo 1991
do IBGE, 31,4 mil feirenses declararam-se sem religião. Nove anos depois, em
2000, o número passou para pouco mais de 51 mil; No Censo 2010, novo salto:
68,3 mil pessoas afirmaram que não seguem nenhuma religião. Pelo visto,
replica-se aqui fenômeno semelhante ao observado em relação à expansão
evangélica: um grande salto no período 1991/2000 e um crescimento mais moderado
no intervalo 2000/2010.
Os dados
censitários atestam a estagnação da Igreja Católica, a ascensão dos chamados
evangélicos e dos sem-religião. A comparação entre os dois censos, porém,
mostra uma tendência à estabilização dos números, com o catolicismo ainda
hegemônico e os evangélicos representando parcela expressiva da população.
Em suma,
pode-se afirmar que hoje, de fato, existe maior diversidade religiosa. E essa
diversidade empresta verdade à máxima popular indicada no início do texto. O
que se espera é que a reconfiguração das opções religiosas da população não
conduza à divisão e à intolerância. Ao logo de séculos, as disputas religiosas
funcionaram como combustível para conflitos fraticidas. Exatamente o oposto
daquilo que Jesus Cristo pregou...
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