Exatamente no
Carnaval em que o chamado Axé Music completa 30 anos, não se fala noutra coisa
que não seja a revitalização da folia momesca em Salvador. As preocupações são
justas: nos últimos anos, a festa baiana mergulhou em uma letárgica mesmice,
enquanto os carnavais de Olinda, em Pernambuco, do Rio de Janeiro, e até de São
Paulo, reinventaram-se, resgatando uma energia que a rotina e a previsibilidade
arrefeceram.
Embora
a constatação seja quase unânime, as opiniões sobre o que deve ser feito são
divergentes, até antagônicas, em alguns casos. Há quem atribua o declínio ao
envelhecimento dos astros do Carnaval – muitos tornaram-se respeitáveis
cinquentões – e à não renovação da constelação de estrelas; alguns enxergam
culpa nos blocos outrora tão badalados e suas cordas excludentes; e há quem responsabilize
os camarotes suntuosos e sua incontrolável sanha expansionista; outros defendem
a desconcentração da folia, com mais palcos nos bairros, como a solução.
As
explicações mais sofisticadas sinalizam para a mercantilização da festa do Momo
em Salvador. Afinal, quase tudo é pago e pago caro: sem abadá e sem acesso aos
camarotes ou às arquibancadas, resta ao folião espremer-se nos espaços exíguos,
expondo-se ao risco de, do nada, ser tragado por uma monumental troca de
sopapos entre gangues ensandecidas.
Há
quem vá além: a mercantilização implica em relação de consumo que, por sua vez,
desagua na padronização dos produtos e serviços. É o pacote que prevê o
legítimo escocês no camarote mais bacana, é o abadá que assegura desfilar com a
banda X num determinado roteiro, é a garantia da companhia de gente bonita e
descolada. Tudo é padronizado, inclusive as músicas, as bandas e as
coreografias. Mais chato e previsível, impossível.
A
essência da questão reside aí: devolver ao povo – a essência criativa da festa
– o protagonismo no Carnaval. Hoje a multidão dança o que lhe ordenam, ocupa os
espaços que lhe são permitidos, consome o que os patrocinadores da folia
vendem, comporta-se de acordo com o roteiro que lhe é imposto. Nada a ver com a
antiga “bagunça organizada” de quem era o protagonista da festa, o povão.
Se
as eventuais soluções que se pretende adotar para resgatar a antiga alegria do
Carnaval de Salvador não passarem pelo restabelecimento do protagonismo
popular, não irão além de remendos. E os remendos, com o tempo, esgarçam-se.
Em
outras palavras, sem o resgate da essência inovadora do Carnaval baiano - o
povo e sua inesgotável criatividade foliã – não se vai muito longe. Devolvam,
portanto, a praça e o condão da festa ao povo.
Como apontado
acima, Olinda, Rio de Janeiro e até São Paulo trilharam esse caminho e hoje
fazem carnavais mais pulsantes que Salvador. E isso apesar da inquestionável
alegria e irreverência dos baianos...
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