Dizem vários
feirenses, sem grande apreço pela cidade, que a Feira de Santana é feia. Aqui,
já de cara, largamos com ampla desvantagem: não temos a poesia e o canto azul
do mar para embalar os finais de tarde, nem as manhãs de domingo. Falta-nos,
portanto, uma orla que atenda os padrões de beleza aos quais os brasileiros
estão acostumados. O patrimônio arquitetônico aqui também é escasso:
descontando uns poucos prédios antigos que servem de amostra de uma belle époque frustrada, os atrativos são
raros. Isso para não mencionar muita coisa que foi demolida.
No
aspecto estético, a geografia também foi madrasta: as belezas naturais são
igualmente raras. As tradicionais lagoas, que inspiram e estão na essência
dessa civilização sertaneja, foram tragadas pela especulação imobiliária ou
pelos esgotos, restando poucos – e mal preservados – exemplos. As extensas
planícies, que por um lado nos poupam penosas subidas, inviabilizam essa
estética geográfica.
A
expansão urbana expulsou os arredores da Feira de Santana para distante dos
olhos. Os morros que circundam a cidade esforçam-se para não sucumbir ao
horizonte urbano que se verticaliza e se espicha na direção da periferia. E,
assim, é necessário esforço do observador para enxerga-los se diluindo no azul
da distância.
Talvez
o rio Jacuípe constitua a mais sólida afirmação da natureza nesses arredores. Fronteiriço
ao sertão, é inimaginável apreciá-lo sem a onipresente figura do mandacaru. Com
a seca impiedosa dos últimos anos, porém, o Jacuípe perdeu parte de sua majestade.
Sem contar que outras mazelas o afligem: as construções irregulares às suas
margens, as baronesas que o empestam e os dejetos espumantes que escorrem para
suas águas, poluindo-o incessantemente.
Cidades
arborizadas também se sobressaem, não apenas esteticamente, mas em função também
das temperaturas amenas e da beleza de milhares de árvores distribuídas pelos
seus espaços. Por aqui, infelizmente, as árvores são escassas. As existentes
costumam ser muito antigas e maltratadas. Na média, o feirense sofre sob o sol
escaldante, enxergando à sua volta asfalto, concreto e cimento ou,
eventualmente, um irônico fícus.
Estética Industrial
Nos frenéticos
primórdios da industrialização, apontava-se a beleza da produção material em
larga escala como forma de expressão estética. Foi assim que o cinza metálico
dos grandes empreendimentos industriais, as volumosas chaminés que cuspiam uma
fétida fumaça tóxica e as levas de operários amarelados ascenderam à condição
de símbolo de muitos lugares cercados por parques industriais. Era o homem desafiando a natureza. Era a estética
do progresso.
Na
Feira de Santana de industrialização retardatária esse discurso chegou
ultrapassado. A simetria dos espaços dos centros industriais, a grama penitente
dos canteiros às vezes bem cuidados e a famosa caixa d’água do Tomba são
heranças desse esforço de emprestar à cidade uma estética ancorada no discurso
do progresso, mas artificial e extemporânea.
Há
quem se refugie nas belezas do céu quando não se vislumbram belezas na terra. Assim,
os infindáveis crepúsculos do verão feirense, que tingem de tinto a quarta
parte do céu, buscam se sobressair no embate com os demais finais de tarde do
sertão. Há quem milite em nome desta causa. Outros se refugiam nas estrelas que
recobrem o céu escuro, de tom esverdeado, das noites feirenses.
Céu,
todavia, existe em toda parte, dirão alguns. E dirão com razão. O que restará,
portanto, como elemento de apreciação estética? Talvez o colossal espetáculo
das trovoadas no verão ou a chuva fina e melancólica nos dias acinzentados de
inverno. Ou, quem sabe, a apreciação da tênue e imprecisa transição entre o
fértil Recôncavo e o inóspito Sertão que se estende muito além das barrancas do
Jacuípe?
Esses
argumentos se diluem em infindáveis bate-papos que nunca levam a posições conclusivas.
Daí essa eterna busca pela beleza da metrópole sertaneja que milhares de
corações, mãos e mentes ergueram em quase dois séculos de História...
Comentários
Postar um comentário