Há
cerca de um ano escrevemos um artigo nesta mesma Tribuna Feirense apontando que o número de homicídios na Feira de
Santana estava se expandindo a taxas decrescentes e que, em algum momento, seria
alcançada uma estabilidade nos números. Nesse mesmo texto indicávamos que, a
partir de então, poderia haver declínio, mas a um preço que não permitiria
comemorações: afinal, o número de pessoas assassinadas a cada ano no município
alcançou a absurda taxa de um assassinato por dia, em média. Isso numa cidade
com cerca de 550 mil habitantes.
Os
números divulgados pela Secretaria da Segurança Pública referentes à violência
na Bahia em 2011, em parte, confirmam esses prognósticos. No ano que se
encerrou houve relativa estabilidade na quantidade de assassinatos em relação a
2010, mas o importante é visualizar a série histórica: nessa, em cerca de uma
década o número de vítimas praticamente triplicou.
Grande
parte da violência se deve à proliferação do tráfico e do consumo do crack. Isso
sobretudo a partir da segunda metade da década passada, quando a droga se
tornou mais acessível em centenas de cidades brasileiras, inclusive na Feira de
Santana que, ironicamente, é prejudicada na sua condição de entroncamento
rodoviário.
Em
parte, o espantoso crescimento da violência no município se deve à epidemia de
crack. Essa dedução, no entanto, é pouco mais que especulação: não existem
estudos que confirmem essas suspeitas e, sequer, existem levantamentos
minimamente confiáveis. O que há são registros policiais não trabalhados
estatisticamente e declarações à imprensa de autoridades policiais.
Exploração política
A
escassez de informações confiáveis, paradoxalmente, constitui pasto abundante
para uma abjeta guerra política. Quem é governo encastela-se comodamente na
alegação que a epidemia constitui uma herança histórica que foi se acumulando
nos 500 anos de Brasil; e quem é oposição arrota o discurso da competência
hereditária empregando o sempre fácil jargão da “gestão”.
Esquecidos
durante muitos anos, os andrajosos usuários de crack que se esgueiram pelas
vielas dos centros das grandes cidades foram, subitamente, lançados à luz da
cena política graças à desastrada operação policial na “cracolândia”
paulistana: a partir de lá, os brasileiros descobriram que os governos
simplesmente não sabem como lidar com a epidemia.
Enquanto
as soluções peregrinam nos escaninhos burocráticos, a indústria do tráfico
produz finados em escala industrial: só na Feira de Santana pelo menos umas mil
pessoas morreram nos últimos anos em função das drogas; são números dignos das
regiões mais conflagradas do planeta, a exemplo do Afeganistão ou do Iraque.
Eleições
Dentro de oito meses os brasileiros elegerão
mandatários municipais para os próximos quatro anos. Em alguns municípios – a
exemplo da Feira de Santana – a violência e, particularmente, o tráfico e o
consumo de crack, figurarão na agenda eleitoral. Isso, inclusive, aconteceu em
2008, quando o tema serviu de mote para a criação de secretarias de resultados
duvidosos.
Inescapável, o tema deveria ser tratado pelos
candidatos com a seriedade necessária. Prefeito nenhum retirará soluções
mágicas de cartolas imaginárias: o problema só poderá ser enfrentado em
articulação com os governos estadual e federal. Repassar a responsabilidade
para adversários políticos ou dizer que a própria parte foi feita constitui uma
excelente desculpa, mas não resolve o problema.
É
bom que a lição da “cracolândia” paulistana permaneça na memória dos eleitores,
inclusive o feirense. Afinal, se o tema continuar a ser tratado com o recurso
da retórica inócua, a mesma cena pode se repetir em outros palcos com atores
vítimas do mesmo mal, para espanto do telespectador brasileiro.
Comentários
Postar um comentário