Ultimamente
vejo de passagem, numa nota ou outra divulgada pela imprensa, que a Prefeitura
Municipal pensa em transferir o comércio atacadista de hortifrutigranjeiros do
Centro de Abastecimento para uma espécie de porto seco que se pretende
construir em algum ponto da BR 116 Norte, na rodovia para Serrinha. A intenção
embute uma constatação óbvia: da forma como está, é impossível a continuidade
da atividade no Centro de Abastecimento. Mas com base em quê se pretende fazer
a alteração?
Em
contínua degradação desde meados dos anos 1980, o Centro de Abastecimento está
em situação pior exatamente onde desembarcam os caminhões que alimentam o
comércio atacadista no entreposto, ali às margens da Avenida Canal, defronte à
praça esportiva Beira-Riacho.
O
cenário é de abandono: cercas com as telas arrancadas, calçadas com grandes
crateras, animais pastando no mato que cresce vistoso perto dos armazéns de
cebola, uma sujeira densa que impregna os paralelepípedos, tornando-os escuros,
lisos e escorregadios e um arremedo de favela que os comerciantes foram
construindo porque o poder público não se manifesta.
Em
dias de chuva os problemas se multiplicam: a lama pastosa se acumula nos imensos
buracos, a água suja das chuvas escorre generosa e a umidade castiga os
freqüentadores. Os cheiros, é desnecessário descrever, desencorajam a presença
de neófitos no ambiente. Tudo isso em meio ao intenso comércio de tomates,
melancias, cebolas, laranjas e bananas que se amontoam pelo chão.
Caos
O
fluxo cada vez mais intenso de consumidores, comerciantes, trabalhadores e
vendedores ambulantes, somado ao vertiginoso vaivém de caminhões, caminhonetes,
utilitários, carros de passeio, carroças, bicicletas e motos torna o entreposto
similar àqueles mercados caóticos que se vêem em lugares exóticos exibidos nas
telas dos cinemas.
Entregue
à Feira de Santana em meados dos anos 1970, como símbolo do progresso que
finalmente chegava à cidade, o Centro de Abastecimento desde então nunca sofreu
qualquer intervenção que acomodasse o crescimento natural da população e das
atividades comerciais.
Entre
a primeira e a segunda metade da década de 1980, com João Durval governador e
José Falcão prefeito, veio uma reforma que trouxe melhorias – mas não ampliação
– e investimentos imprescindíveis em infra-estrutura, que definiram as
configurações atuais do entorno.
Futuro
Desde
então, as intervenções no Centro de Abastecimento não passaram de paliativos
que atenuaram os efeitos da ausência de investimentos. Nos períodos eleitorais
arrisca-se uma pintura, uma lavagem nas rampas e corredores ou generosas doses
de creolina despejadas nas latrinas infectas. O investimento mais robusto foi a
troca do piso – necessária – e a troca da cobertura nuns galpões, que atenuou a
escuridão medieval do projeto original. Tudo muito pouco, conforme um rápido
exame atesta.
A
necessidade de introduzir melhorias no CAF é óbvia, nem precisa ser discutida.
No entanto, o entreposto assume uma importância para o município – por sua
relevância econômica, por sua identidade cultural e por sua articulação com o
trabalho de pequenos comerciantes, ambulantes e consumidores domésticos – que
qualquer decisão extrapola o âmbito administrativo. Torna-se necessário
consultar a comunidade.
Assim,
pura e simplesmente desmembrar parte do conjunto da feira-livre – removendo-a
para ali ou alhures – lembra muito, noutro contexto, a truculenta transferência
da feira-livre do centro comercial para o Centro de Abastecimento, em meados
dos anos 1970. Perdeu a feira e perdeu a Feira. Um debate prévio seria
imprescindível para que o triste episódio não se repita nos dias atuais...
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