Domingo é o
dia mais recomendável para se descobrir como vive um povo. Como se divertem,
como são os momentos de descontração, como se relacionam com amigos e
familiares. Domingo em Havana surpreende o desavisado viajante de País
capitalista: as pessoas se dedicam ao ócio de maneira muito similar àquilo que
se vê nos arredores latino-americanos. Ao longo do Malecón bebem-se generosas doses de rum, passeia-se com crianças
endiabradas, adolescentes flertam com intenso alarido, casais de mãos dadas
inspiram-se sob o sol cálido e o mar tranqüilo.
No final da
tarde, um intenso burburinho toma conta das imediações do Hotel Nacional: formam-se
filas, fala-se aos berros e extravasa-se a alegria do encontro, dali a
instantes, com a exibição de um filme de Batman. Contenho a marcha, examino
atentamente o cartaz exposto na entrada: Batman, de fato.
Os bêbados
cubanos são tão chatos quanto seus similares brasileiros: à beira-mar um deles,
entupido de rum, vocifera, esbraveja, baba e demonstra seu desarranjo com uns
gestos trêmulos: a mulher – provavelmente a mulher – tenta convencê-lo, com
paciência declinante, a atravessar a rua. Crianças miúdas já o fizeram e uma
senhora gorda e idosa, que vaqueja os pequenos, lamenta a carraspana com
impropérios.
Fiquei uns
instantes apreciando os esforços para fazer o bêbado atravessar a rua. Ao redor
casais, muitas crianças, homens e mulheres, riam, se divertiam com o vexame.
Por fim, o bebum acabou convencido a
atravessar a avenida. Depois que o fez, seguiu reclamando e, por fim, o cortejo
dobrou uma esquina e desapareceu.
O sol muito
morno era um convite para preguiçar à beira-mar até o fim da tarde. Soprava um
vento suave, um pouco frio, o que tornava o sol mais acolhedor. A luz que se
refletia, escandalosa, nas fachadas embaçava a vista, produzia uma sensação
muito agradável.
Tarde de
domingo sem consumo conspícuo. Somente a brisa marinha, o sol cálido, a melodia
dos mares, a dança das ondas, os passos preguiçosos ao longo do calçadão. Umas
gaivotas sobrevoam os arredores e piam alto. As asas cortam o ar num bailado
desengonçado e trêmulo.
Nos curtos
intervalos em que o mar toma fôlego, paira um silêncio profundo, suavemente
rompido pelas vozes e risos distantes, pelos sons abafados dos motores
longínquos.
Naquela tarde
as referências capitalistas se diluíram, deixando um vazio preenchido por uma
lânguida reflexão. Pensava nos símbolos do consumo, típico das tardes de
domingo. Pensava, mas não conseguia achar respostas.
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