Os temas nas
campanhas eleitorais aparecem como modismos, sobretudo nas disputas
majoritárias. Lá adiante, alguns deles são inteiramente esquecidos. É o que
demonstra essa corrida eleitoral. Há apenas quatro anos, quando a atual
presidente Dilma Rousseff (PT) e o ex-ministro José Serra (PSDB) travavam uma
batalha renhida pela Presidência da República, o consumo de crack era um dos
temas mais palpitantes daquelas eleições.
Quem
não lembra de José Serra prometendo espalhar pelo Brasil o mesmo modelo exitoso
de combate ao vício existente, segundo ele, em São Paulo? Quem não recorda
Dilma Rousseff assumindo diversos compromissos referentes ao enfrentamento da
epidemia? Pois bem: quatro anos depois, em 2014, ninguém aborda mais o problema.
Pode-se
deduzir que o tema perdeu o apelo junto ao eleitorado médio. Afinal, as
tragédias individuais e coletivas continuam se desenrolando desde então, sem
perspectivas de solução. Deixaram, portanto, de ser novidade e até não chocam
mais.
Na Salvador de
inúmeras “cracolândias” – assim foram batizados os espaços públicos, como
praças e avenidas, ocupados pelos usuários da droga para consumo e residência
improvisada – uma delas, especialmente, estarrece pela amplitude e pela
degradação: a que foi, aos poucos, se implantando na rua Cônego Pereira, no
trecho do novo Mercado das Sete Portas.
Os
incontáveis colchões, esfarrapados e encardidos, espalhados sob as marquises de
prédios abandonados, denunciam a presença dos dependentes. Muitos passam o dia
largados sobre a espuma, à espera de oportunidades de consumir a droga ou,
simplesmente, exauridos pelo uso recorrente. Outros circulam com sacos imensos,
abarrotados de latas, que são vendidas para, com o dinheiro, sustentar o vício.
Quem
consegue alguns trocados para consumir o crack corre, frenético, para o canal
por onde escorre a água imunda dos esgotos da região. E, sem grande pudor, a
qualquer hora, acende o cachimbo improvisado, alheio a carros e pedestres ao
redor. Às vezes, um usuário mais pudico esconde a cena pendurando um cobertor
sob a cobertura de concreto que reveste o canal.
Seguramente
mais de 50 usuários espalham-se pelas redondezas, próximos das bocas-de-fumo, à
espera de uma oportunidade de consumir mais crack. Pedestres e trabalhadores
das proximidades simplesmente ignoram os viciados, já habituados àquelas
presenças.
Naquele
pedaço esquecido de Salvador a tragédia
do crack subsiste, embora o tema tenha sido varrido da campanha eleitoral.
Nesses quatro anos, entre as duas eleições, milhares de usuários foram
assassinados, outros tantos se tornaram imprestáveis para uma vida produtiva e
o tráfico persiste, ao largo das intervenções do Estado.
Alguns estudos
sinalizam que a epidemia é um problema mais do Nordeste que das demais regiões
do País. Talvez isso explique a omissão em relação ao tema nessa campanha presidencial.
Explica, mas não justifica o arrefecimento do debate e, menos ainda, o contínuo
desenrolar dessa tragédia diante do Estado apático, quase inerte em relação à
questão...
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