Acompanho, com
algum interesse, a evolução das discussões sobre o financiamento da cultura na
Bahia nos últimos anos. Há muito se fala sobre a questão: antigamente, os
artistas do interior reclamavam da desatenção dos governantes soteropolitanos,
na Soterópolis, que ignoravam a produção cultural em centenas de municípios, no
momento de repartir o orçamento; hoje, as reclamações no interior declinaram um
pouco, mas, em Salvador, muitas vozes se elevaram fazendo alusões ao “caos” da
cultura e reivindicando o retorno aos velhos tempos.
Não restam
dúvidas sobre a riqueza e a diversidade culturais da Bahia e sobre o potencial
desses atributos na geração de riquezas, de postos de trabalho e na atração de
visitantes através do turismo. A exploração desse potencial, no entanto, passa
por um impulso inicial que, por sua vez, depende dos recursos disponíveis.
Os orçamentos
da União e dos Estados destinados à cultura são bastante modestos: oscilam
entre 0,7% e 1% ao longo dos anos. Em momentos excepcionais, chegam a 1,5%, mas
são os primeiros a sofrer cortes ou não alcançar a execução orçamentária
prevista quando crises se insinuam no horizonte.
Escassos,
esses recursos tem usos múltiplos e costumam ser disputados de forma ferrenha:
parte significativa vai a manutenção ou recuperação de monumentos históricos,
cujo apelo turístico é inegável; outra parte destina-se às bibliotecas e ao
funcionamento de espaços culturais; o que sobra – pouquíssimo – vai financiar
projetos culturais.
Profissionalização
A fila de
espera dos projetos culturais é extensa: as disputas começam entre municípios
ou territórios do Estado, se estendem pelas diversas linguagens artísticas e,
enfim, findam no critério técnico da qualidade do projeto. As sucessivas etapas
consomem tempo e costumam esgotar a paciência dos artistas que, desconsolados,
nem sempre tem disposição para insistir até o final.
Embora às
vezes inglória, essa batalha tende a se consolidar como modelo de acesso ao financiamento.
Uma evidência é a proliferação de editais em diversas modalidades, nas esferas
estadual e federal. As restrições orçamentárias impelem à adoção do modelo e
colocam, para os artistas, desafios adicionais.
Hoje já não
basta dedicação ou originalidade para difundir a própria arte. É necessária a
profissionalização, que envolve sintonia com editais, prazos e fontes de
financiamento, desenvoltura técnica na elaboração de projetos e constante
atualização em relação às políticas públicas para o setor.
Prestação de Contas
Os desafios,
no entanto, estão apenas começando quando o artista consegue o financiamento. A
aplicação exige rigorosa disciplina contábil para evitar transtornos mais
adiante e, ao final do ciclo, há o desafio da prestação de contas. Os
documentos devem guardar perfeita sintonia com o que pensam os técnicos
governamentais. Algum deslize e as portas do financiamento podem se fechar.
A austeridade
crescente das políticas públicas de financiamento cultural não foi acompanhada
pela profissionalização dos artistas, sobretudo daqueles vinculados à arte
popular. Isso dificulta o acesso a recursos e, sob determinados aspectos,
subtrai um tempo precioso que poderia ser dedicado ao aprimoramento artístico.
Existem
alternativas a esse modelo? Apenas dois caminhos se colocam, ambos de difícil
viabilidade: o financiamento privado, nem sempre acessível para quem não dispõe
de uma rede de relacionamentos ampla, e a auto-sustentabilidade, que significa gerar recursos para viver da
própria arte. Inviáveis para a maioria dos artistas e em muitas formas de
manifestação, impõem, portanto, o rígido convívio cotidiano com os editais...
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