“José
Theodoro Pamponet offerece seus serviços ao abolicionismo d’esta comarca. Os
‘escravisados’ que se julgarem com direito à sua liberdade, quer por effeito da
lei de 7 de novembro de 1831, quer por outra lei, podem procurá-lo n’esta
cidade, no escriptorio d’este Jornal”.
A
oferta está nas páginas d’O Asteróide, “orgam da propaganda abolicionista”,
conforme grafia da época. Saiu na edição de 6 de dezembro de 1887, às vésperas
da abolição formal da escravidão, que ocorreu no ano seguinte. A sede da
publicação era na vizinha cidade de Cachoeira.
O
“redactor” de O Asteróide era o próprio José Theodoro Pamponet. Navegando pela
Internet descubro que, anos antes, em 1871, ele se aventurara na Guerra do
Paraguai. Contra os defensores da escravidão, o arrojado redator não poupou
adjetivos. Inclusive contra os poderosos do Recôncavo, quando celebrou a
alforria concedida pelo proprietário Affonso Pedreira de Cirqueira a um grupo de
escravos:
“Sirva
essa acção honrosa de luz ao ‘feudalismo’ engenhocrata de Iguape e Santo Amaro,
que tanta inovação tem feito ao senhor de Cotegipe para não extinguir esse
cancro horrível – a escravidão”.
Adiante,
na mesma publicação, sobrou também para os clérigos. À época, nem todos os
religiosos estavam convencidos dos horrores da escravidão. José Theodoro
Pamponet fustigava-os:
“Quem
é contra a liberdade é contra Jesus, os padres que têm escravos são por certo
contra Jesus”. Os torpedos não se encerraram aí: “Tem concorrido abundantemente
os padres para o aniquilamento (os padres que possuem escravos) dos costumes
sociaes e dos princípios de caridade”.
Naqueles
tempos a escravidão estertorava. E arrefecia não só em função da pressão dos abolicionistas.
É que manter escravos já não era vantajoso, sobretudo na lucrativa cafeicultura,
que se espalhou por São Paulo e Paraná a partir do sul do Rio de Janeiro.
Nenhum pudor moral impulsionava os barões do café: era mais negócio contratar
mão-de-obra livre que empatar capital na aquisição e manutenção de escravos.
Nas
regiões cujas economias eram menos dinâmicas, como o Recôncavo, a resistência à
abolição era maior. É o que atestam as páginas d’O Asteróide. No ano seguinte
veio a libertação formal dos escravos, mas a inclusão social da população negra
e parda segue como um desafio até os dias atuais, mesmo com os avanços tímidos
registrados nos últimos anos, como o sistema de cotas nas universidades
públicas.
Mas mesmo esses avanços
tímidos estão ameaçados pelos trogloditas alçados ao Planalto Central. É o que
atestam declarações e, sobretudo, práticas abomináveis como destruir um cartaz
em plena Câmara dos Deputados.
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